Tishá BeAv – O Dia em que Choramos por Jerusalém

Por: David Havilá 

O Peso da História

  • Tishá BeAv, o nono dia do mês hebraico de Av, é o dia mais escuro do calendário judaico, em que nos reunimos como povo para lembrar — e lamentar — as tragédias que atravessaram nossa história. Não apenas como memória histórica, mas como consciência espiritual coletiva.

Neste único dia confluem múltiplas calamidades:

  • A destruição do Primeiro Templo, pelos babilônios (586 a.E.C.).
  • A destruição do Segundo Templo, pelos romanos (70 E.C.).
  • O fim sangrento da Revolta de Bar Kochba (135 E.C.).
  • A expulsão dos judeus da Inglaterra (1290).
  • A expulsão dos judeus da Espanha (1492), cuja data-limite caiu justamente em Tishá BeAv.

Ainda que nem todas essas tragédias coincidam cronologicamente de forma precisa, a tradição judaica intuiu algo mais profundo: há uma dor transversal que ecoa nessa data, como se a própria alma do povo judeu reconhecesse que foi neste dia que o mundo perdeu seu eixo espiritual.


Tishá BeAv é um jejum completo de 25 horas, do pôr do sol ao anoitecer seguinte, semelhante a Yom Kipur. Mas, ao contrário de Yom Kipur, que é um jejum em busca da reconciliação, este é um jejum de luto. Ele não mira o Céu diretamente — ele desce ao pó da dor humana.

As proibições incluem:

  • Comer e beber
  • Banho, uso de óleos ou perfumes
  • Calçados de couro
  • Relações conjugais
  • Estudo de Torá (exceto textos ligados à destruição ou luto)

Na sinagoga, sentamo-nos em bancos baixos ou no chão. As luzes são diminuídas. Lê-se o Livro das Lamentações (Eichá), composto pelo profeta Jeremias, com entonação triste. Em seguida, recitamos Kinot — poemas e elegias escritas ao longo dos séculos, desde a destruição dos Templos até a Shoá.


Segundo os mestres da Cabalá, a destruição dos Templos não foi apenas um evento geopolítico — foi um rompimento cósmico. O Templo era a morada da Shechiná, a Presença Divina revelada. Sua destruição marca o início do Galut HaShechiná — o exílio da própria luz divina do mundo.

No Zôhar (parashá Pinchás), lemos que “na hora da destruição do Templo, a Shechiná vestiu-se de luto, e os céus choraram”. A dor de Tishá BeAv é, então, não apenas nacional, mas universal: é o lamento pela ocultação do Divino, que ainda espera para se revelar completamente.

O Ari z”l (Rabino Isaac Luria), mestre cabalista do século XVI, ensina que cada lágrima vertida em Tishá BeAv tem o poder de reparar mundos espirituais. Ao jejuar e lamentar, não apenas relembramos o passado — participamos ativamente do tikun, da cura do exílio cósmico.


É quase paradoxal, mas a mesma tradição que nos mergulha em dor ensina: no próprio Tishá BeAv nascerá o Mashiach (Midrash Eicha Rabá 1:51). Da escuridão mais profunda, brota a centelha da luz final.

À medida que o dia termina, aos poucos retomamos práticas normais. O tom da leitura muda. A alma começa a se erguer novamente. Da mesma forma como as cinzas da destruição cobriam o chão do Templo, sobre elas florescerá a reconstrução.


Em tempos modernos, Tishá BeAv nos convida a um luto mais consciente. O que ainda está destruído dentro de nós? Onde falhamos como comunidade? Como o povo judeu pode curar as divisões internas que também causaram destruições anteriores?

O Rabino Jonathan Sacks z”l escreveu:

“Tishá BeAv não é apenas sobre o que nos fizeram, mas sobre o que fizemos a nós mesmos — e o que podemos fazer para mudar o futuro.”


✡️ Tishá BeAv e o Despertar Espiritual

Hoje, mesmo com a existência do Estado de Israel e a vibrante vida judaica ao redor do mundo, Tishá BeAv permanece relevante. A reconstrução política ainda não é redenção espiritual. Ainda ansiamos por um mundo sem ódio, sem guerras, sem o silêncio de Deus.

É nesse espírito que Tishá BeAv não é apenas um dia de jejum, mas um chamado à teshuvá, à restauração da relação entre o céu e a terra, entre o humano e o divino.


📚 Fontes e Referências Bibliográficas

Livro das Lamentações (Eichá)

Talmud Bavli, Tratados Guitin 55b–58a; Taanit 26b

Mishná, Tratado Taanit

Midrash Eicha Rabá

Zôhar, Parashat Pinchás

Rabino Isaac Luria (Ari z”l), Sha’ar HaKavanot

*Kinot Tradicionais de Tishá BeAv

R. Joseph B. Soloveitchik, “Out of the Whirlwind”

Rabino Jonathan Sacks, “Covenant & Conversation”

Shulchan Aruch, Orach Chaim 552–559





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